IV Edição da Consciência Negra em Caieiras


Desço na estação CPTM Caieiras, demora certo tempo até que um iluminado motorista ceda a vez de passagem para os pedestres e avisto o ônibus Jardim Marcelino, local de destino. O tempo chuvoso não favorece uma aventura além-cama-cobertor, ainda mais se tratando de um domingo (25/11), entretanto, “Racismo aqui não”, a faixa estendida no palco, resume o porque da busca. 
Em Caieiras, cidade dos Pinheirais e marcado por condomínios luxuosos, o dia 20 de novembro não é instituído como feriado sob a cínica alegação por parte dos representantes públicos de que já existem muitos feriados. Pelo jeito, também tem muita desigualdade e preconceito também.
Na IV Edição da Consciência Negra, instalada ao lado do Ginásio Esportivo, o casal Rosa Martins e Décio Vieira representava o 1° Sarau de Caieiras, iniciado a partir do fim do ano passado e desde então vem sendo realizado em bares do bairro Portal Laranjeiras, com distribuição de gibis uma vez ao mês. Além da ação, trazem o Educafro, juntamente com a Associação Perseverança (do bairro Vila Rosina), com inscrições abertas para o primeiro semestre de 2013.
Décio Vieira, professor, militante e autor do livro O Canto da Diáspora, teve de lançar o livro em Pinheiros. “Na época, o atual Secretário de Cultura (Tânia Chibata) interferiu e negou o lançamento aqui e sem mais detalhes”, explica Rosa. Até agosto do ano que vem o autor vai lançar outro livro, ainda sem título definido. 
O público, ainda tímido, tinha como maioria jovens. Lucas Souza, 14 anos e Mateus Weslei, de mesma idade, ambos moradores do Jardim Vitória, entram em um consenso quando questionados sobre a frequência de iniciativas para a juventude: “deveria acontecer mais”. A roda de garotos (a maioria montados em suas bicicletas) era grande. Reclamaram da falta de praças no bairro – apenas uma está sendo construída no Jardim Marcelino – da pouca frequência de eventos, da quadra de futebol que não tem manutenção e dos buracos nas ruas de casa.
Apreciadores de Rap, “pois é quem fala a verdade”, segundo Mateus, guardam sonhos para o futuro. Mateus quer ser engenheiro e Lucas pretende dar continuidade aos negócios do pai como mecânico.
“Falta centro cultural, se quer acabar com o crime, coloca cultura”, protesta Guina, 30 anos cabeleireiro. Complementando a frase, Jamais, 45 anos, encarregado de produção afirma “os próprios negros se acham brancos, se bloqueiam por serem negros bem sucedidos. Precisamos trazer educação e cultural, esta juventude precisa de incentivo.”
Guina e Jamaica alguns dos responsáveis pela atuação do Bambu promover durante o ano o Dia da Consciência Negra, Dia da Cidadania (com cortes de cabelos grátis, gincanas e distribuição de brindes), o Festival de Pipas, Dia das Crianças (atingindo o número de 1.200 crianças de público) e Corrida da Páscoa.
Como uma flor não tem apenas espinhos, vamos dar vazão as suas pétalas e perfume. O Bamboo Brasil tem 10 anos de existência e hoje conta com o apoio de outras iniciativas e associações como o já citados 1° Sarau de Caieiras, Associação Perseverança, Palco Pirata, Rádio Onda, Cultura nunca é D+, comerciantes, a colaboração de duas vereadoras e o palco, iluminação e autorização para a realização do evento da Prefeitura.
“Unificar as atividades culturais que acontecem de forma comunitária e que entendam as necessidades da comunidade para se ter cada vez mais força”, diz Pirica, um dos organizadores. 
O público pôde contemplar as apresentações de Marcelo Black SAI, Décio Vieira, Solano Trindade, Terra de Graça, Casulo de Rudá, Grupo Legítima Função, G.R.A.D.I, o Foco, Opirahe Crew, Dj Maguado, Dj Kannibal, Grupo Pura Malícia e Grupo Parakundê.
Interessante analisar que existem iniciativas e pessoas dispostas a mudar a desigual realidade que já se tornou comum na história do morador de periferia, em sua maioria, negros. Mesmo em volta a dificuldades na história há sempre aqueles que jamais desistem.
Guina, no palco, falou algo muito profundo e verdadeiro e quando muitos entenderem muita coisa irá mudar: “Deus me deu asas e agora vou voar.”


Tamires Santana
Jornalista

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